Com a chegada da idade, algumas coisas se vao - dicotomias ah parte. A memoria eh uma delas, indubitavelmente. Certos momentos e eventos em nossas vidas, ah medida que os anos passam, parecem ter acontecido em outra vida. Ou, pior ainda, na vida dos outros.
Nunca pensei que eu seria traida pela idade. Justo eu, que sempre fui tao boa de "memoria". Nada passava despercebido pelo meu cerebro: depois de vivido e processado, era lah que ficaria pra sempre. Mas nao, caros amigos. Descobri que o tempo (e talvez um pouquinho de cerveja tambem) pode ser cruel com o que de bom - e ruim - ficou armazenado na cachola.
Foram 27 anos e uns quebrados de historias ateh entao. Vida fragmentada entre algumas cidades e paises diferentes. Muitas idas e vindas. Um pouco de alcool tambem pra atrapalhar no armazenamento de certos eventos. E com a chegada de uma nova decada, a certeza: eu estou ficando velha. E minha memoria eh a prova viva disso.
Eu sempre me orgulhei da minha ilustre capacidade de lembrar nomes, fatos, datas, trivialidades, coisas importantes e futilidades tambem. Nada comparada ao meu amigo Frederico, que eh praticamente uma Wikipedia ambulante, mas sempre fui boa nessas coisas de "lembrar". Historias do tempo de Ensino Fundamental, Medio, Unisinos, CCAA, Africa, Irlanda, Porto Alegre, Sao Leopoldo, Novo Hamburgo: eu nao esquecia nada. Flertes, ex-flertes, flertes nao concretizados: nada escapava da fabulosa memoria de Hell Pinto. Ateh pouco tempo...
Eu tenho esquecido as coisas. Fatos, eventos, pessoas. Alunos. Historias. Partes da (minha) vida. Parece que uma parte do meu "hd" lotou. Tah cheio. E, automaticamente, comecou a fazer uma limpeza pra garantir espaco pra memorias novas. Sem muito criterio nao: vai apagando o que vem pela frente. Tah, eu sei, eu nao sou tao velha assim. E nao vivi nada se comparar minha vida com a de outras pessoas, eu sei. Nao entremos nesse merito. Nao eh esse o tom. O fato eh que eu tenho esquecido. Coisas importantes, pessoas, partes de mim. E eh triste, nao?
Dei-me conta de tal fato dias desses em que frequentei o famoso Ginasio Celso Morbach (se nao conhece, google it!) num grandioso evento na minha cidade natal. Comecei olhar pros lados, pras pessoas. Rostos conhecidos, muito familiares, mas quem eram essas pessoas? Alunos, ex-colegas, pessoas que algum dia fizeram parte da minha vida de tal forma. E me deu uma sensacao de vazio. Vazio misturado ah agonia. Como poderia eu esquecer? Eu sei, too much drama for nothing. Mas me afetou.
Eh triste ver pessoas que a gente ama partir -seja pra outro lugar, seja pra sempre, seja pra fora de nossas vidas - mas, mais triste ainda eh nao lembrar. Nao poder lembrar. Nao conseguir. Ter vivido e poder buscar na caixinha aqueles bons momentos pra dar umas boas gargalhadas (ou derramar algumas lagrimas pra lavar a alma) posteriormente. Esquecer. Nao tem coisa pior.
Num momento desses, resta o consolo de saber que o que eh essencial nunca vai ser esquecido (a nao ser que o Alzheimer me "pegue" algum dia). Que eu nunca vou esquecer como foi e com que foi meu primeiro beijo. As tardes na casa da Voh Leboutte. O pudim da minha mae. O primeiro lp dos Beatles. O primeiro amor. A primeira decepcao. As grandes amigas dos tempos de colegio (por mais que vivam em mundos completamente diferentes do meu agora). Os tempos aureos da faculdade. O saudoso CCAA. A folclorica Sao Leopoldo. Os abracos verdadeiros pelos aeroportos da vida. Os jogos e todo sofrimento com o meu time. A batalha dos aflitos. O time do Felipao e o do Mano. A primeira aula de Ingles que eu dei. A distincao no TCC. Aquele friozinho na barriga ao pisar no John Lennon Airport. A Africa do Sul. A Europa. O Mexico. A querida Cultura Inglesa e seus maravilhosos alunos. Os amigos da Capital. Os amigos do Interior. Os amigos do mundo. A melhor amiga em SP. Os Leite-Pinto.
Eh, o que eh mais importante fica. Pra sempre. E bom mesmo eh saber que tem muito mais por vir. Lembrando depois ou nao.